O caso Calabote 59 anos depois

O jogo em que o adjunto do Benfica Valdivieso treinou o Torriense.

Foi exatamente há 59 anos. Estamos em 22 de março de 1959. Nesse dia era conhecido o campeão nacional. São três da tarde e a bola começa a rolar em todos os estádios. Em todos não. Na Luz, o Benfica recebe a CUF e sobe ao relvado oito minutos depois do início do jogo Torriense– F. C. Porto.

O treinador do Torriense nesse jogo era Valdivieso que chegou ao Torriense poucos dias antes do jogo decisivo e era o anterior adjunto do treinador do Benfica. A estratégia é retardar a partida o máximo possível, de forma a saber o que se passa em Torres Vedras, no Torriense-F. C. Porto.


Os portistas estão a um pequeno passo do título: são líderes com os mesmos pontos do que os rivais da Luz, mas com vantagem na diferença de golos. Para ser campeão, o Benfica precisa de marcar mais cinco golos do que aqueles que os portistas marcassem.


No Campo das Covas, já se contam oito minutos de jogo, quando na Luz, Inocêncio João Teixeira Calabote, árbitro internacional de Évora e com passado infeliz nos jogos com o F. C. Porto, faz soar pela primeira vez o apito.

A primeira parte corre de feição às águias que chegam ao intervalo a vencer por 4-0, com os dois primeiros golos de penálti, o segundo dos quais considerado inexistente por toda a crítica.


A vantagem era insuficiente, uma vez que os portistas já tinham inaugurado o marcador. Na segunda parte, já depois do golo de honra da CUF, o Benfica não demoraria a dilatar a vantagem com mais dois golos, um deles de penálti. Os encarnados são virtualmente campeões. Festeja-se na Luz, sofre-se nas Covas.


Não por muito tempo. O portista Noé faz o segundo golo e a festa volta a Torres Vedras. Por pouco tempo também. De rajada, os benfiquistas fazem o 7-1, já o guarda-redes Gama, da CUF, tinha sido substituído, a pedido dos colegas, numa tarde muito infeliz…


Porém, em cima do minuto 90, Teixeira faz o 3-0 e volta a entregar o título ao F. C. Porto. O jogo termina a seguir, mas não há campeão. Na Luz, ainda faltam jogar oito minutos, mais os quatro de compensação concedidos por Calabote – que ainda expulsou três jogadores da CUF -, quando, na altura, não era normal dar-se mais do que dois.

 Foram 12 longos minutos de sofrimento em Torres Vedras, enquanto o Benfica desesperava por mais um golo, que não veio a acontecer, segundo dizia a imprensa na altura que o arbitro se tinha enganado no total dos golos que o Benfica tinha de marcar.

A festa mudava-se, de vez, para as Covas.


Poucos dias após o mais dramático epílogo dos campeonatos, Calabote é alvo de inquérito federativo e acusado de ter mentido no relatório, escrevendo que o jogo principiara às 15 horas e terminara às 16.42 horas.

O árbitro de defende-se e diz que o seu relógio é que vale. Nada feito. É acusado de corrupção, mas diz que nunca recebeu um tostão. É irradiado uns meses mais tarde.


Nota: Segundo a Comunicação Social dessa altura, Calabote depois de ter sido irradiado foi trabalhar para o Benfica alguns meses depois.

Nota; Os “Cadernos da ABOLA” emitidos há uns bons anos por este jornal desportivo aborda superficialmente este triste e vergonhoso caso que envergonhou na altura o futebol português e que ainda perdura na memória de muitos desportistas.

Texto: Américo Rio Espinheira